A Emenda Constitucional nº 132 de 2023 trouxe mudanças significativas na tributação do consumo, o que afetará a grande maioria dos negócios no Brasil. Para as empresas do Simples Nacional, a reforma tributária apresenta desafios ainda maiores e oportunidades que precisam ser compreendidas para que possam se adaptar adequadamente.
Com a reforma, os tributos federais, estaduais e municipais sobre o consumo (IPI, ICMS, PIS, COFINS e ISS) serão substituídos por dois novos tributos:
IBS (Imposto sobre Bens e Serviços), que substituirá o ICMS (imposto estadual) e o ISS (imposto municipal).
CBS (Contribuição sobre Bens e Serviços), que substituirá o PIS e a Cofins (impostos federais).
1. Como o Simples Nacional Funciona Hoje?
O Simples Nacional é um regime simplificado, onde empresas podem pagar vários tributos (IPI, IRPJ, CSLL, CPP, PIS, Cofins, ICMS e ISS) em uma única guia, com base na receita bruta. Ele facilita o recolhimento de impostos, mas tem limitações, principalmente no aproveitamento de créditos tributários.
1.1. Como funciona a tomada de créditos por uma empresa do Simples Nacional antes da Reforma
De início, infelizmente, as empresas do Simples não podem se creditar dos tributos pagos nas suas aquisições, o que reduz a competitividade. Vejamos:
Em matéria de IPI: Optando pelo Simples Nacional, as empresas as empresas do Simples Nacional não poderão se apropriar de créditos de IPI, de acordo com art. 177 do Regulamento do IPI (RIPI).
Em matéria de PIS COFINS: Somente as empresas do Lucro real podem tomar crédito de PIS e COFINS, de acordo com o art. 3 da Lei 10.833/03. Com efeito, empresas do Simples não terão direito a créditos de PIS e COFINS.
Da mesma forma, em matéria de ICMS: Em regra geral, as empresas do Simples Nacional não podem se creditar de ICMS sobre aquisições de mercadorias que ela fez que geram ICMS. Única exceção é quando a empresa do Simples Nacional atinge o sublimite de R$ 3,6 milhões que nesse caso deverá recolher o ICMS de forma separada.
Em matéria de ISS: por se tratar um imposto cumulativo, não é possível de creditar de ISS quando uma empresa toma um serviço. Isso vale para todos os tipos de regime. O valor é considerado como um custo.
Em resumo:
Apropriação dos créditos
PIS e COFINS: não tem direito ao crédito.
ICMS: não tem direito ao crédito.
IPI: não tem direito ao crédito.
E se a empresa do Simples que ultrapassou o sublimite de R$ 3.600.000 até R$4.800.000 de faturamento anual:
PIS e COFINS: não tem direito ao crédito.
ICMS: tem direito ao crédito, respeitando o previsto na legislação do ICMS.
IPI: não tem direito ao crédito.
1.2. Como funciona a transferência de créditos de tributos provenientes de aquisições de mercadorias das empresas do Simples Nacional antes da Reforma
É importante analisar também se os tributos nas vendas da empresa do Simples Nacional podem ser creditados pelos seus clientes, no caso de empresas que adquirem seus produtos ou serviços.
Pois, como já explicamos, para uma empresa fora do Simples, a exemplo do lucro real, se meu cliente tem direito a crédito dos tributos sobre os bens que ele comprou, na revenda desses bens, ele só irá pagar a diferença entre o que comprei e o que vendi.
Em relação ao ICMS: Se uma empresa do Simples Nacional vende uma mercadoria para uma empresa do regime normal de apuração do ICMS, a empresa do Simples Nacional poderá repassar o crédito de ICMS a essa empresa do regime normal de apuração. Mas é preciso observar que o total do crédito ficará limitado ao valor efetivamente devido pela empresa do Simples Nacional (art. 58, §1 da Resolução CGSN 140/2018). Observe que para um cliente que compre bens de uma empresa do Simples que está no meio de uma cadeia produtiva, essa aquisição não é tão interessante, se comparada às aquisições entre empresas fora do Simples já que, nesse caso, teria direito ao valor de ICMS com base em uma alíquota normal de 18% por exemplo.
Em relação ao PIS e COFINS: a empresa adquirente de mercadoria ou de serviços do Simples nacional fará o cálculo de quanto ela poderá se creditar de PIS e COFINS. Empresa do regime normal que comprou do Simples poderá se creditar com base em sua própria alíquota, ou seja, de 9,25% mesmo que no Simples nacional o valor pago de PIS e COFINS seja diferente e bem menor. Não importa quanto a empresa do Simples Nacional pagou de PIS e COFINS, já que a regra é estabelecida olhando para empresa adquirente. E como somente uma empresa do Lucro real poderá optar pelo regime não cumulativo do PIS e COFIS, essa empresa terá um crédito de 9,25% de PIS e COFINS (arts. 2 e 3 da Lei 10.833/2003).
Em outro olhar, nesse caso, a empresa do Simples Nacional consegue passar os créditos muito maiores do que ela realmente pagou de PIS e COFINS em seu cálculo unificado.
Em relação a IPI: a empresa do regime normal também não poderá se creditar do valor de IPI em decorrente da compra de mercadoria de uma empresa do Simples Nacional (conforme art. 178 do RIPI de 2002).
Observem que se trata também de um entrave para uma empresa do Simples Nacional atuar no ramo de indústria, pois não é interessante para empresas do regime normal adquirir seus produtos sem direito a crédito.
Em resumo, transferência de créditos observa-se:
PIS e COFINS: adquirente apure pelo regime não cumulativo pode se apropriar de créditos conforme lei do próprio PIS COFINS.
ICMS: adquirente pode se apropriar dos créditos que foram recolhidos pela empresa do Simples Nacional.
IPI : não se apropria dos créditos de aquisições de empresas do Simples.
No caso de sublimite:
PIS e COFINS: adquirente apure pelo regime não cumulativo pode se apropriar de créditos conforme lei do próprio PIS COFINS.
ICMS: adquirente pode se apropriador dos créditos de maneira integral, conforme lei do ICMS.
IPI : não se apropria dos créditos de aquisições de empresas do Simples.
Por fim, é importante frisar que conforme jurisprudência pacífica, não possível que uma empresa aderir de modo parcial ao regime do Simples Nacional. Ou seja, não é possível aderir para uns tributos e para outros não. Ou você adere ao Simples sob sua versão total ou não adere (STJ, Resp 1.307.667/ SC; ou STF, RE 970.821, Min. Edson Fachin, 12-05-2021).
2. Impactos da Reforma Tributária para o Simples Nacional
A reforma tributária mantém o Simples Nacional para micro e pequenas empresas, mas com mudanças significativas na forma como os créditos tributários serão tratados, e isso irá impactar diretamente os negócios dessas empresas. A seguir, destacamos os principais pontos.
2.1. Opção de Crédito para IBS e CBS
Com a nova reforma, as empresas do Simples Nacional poderão escolher entre:
Manter o regime simplificado, apurando e recolhendo o IBS e CBS junto aos outros tributos, sem poder transferir créditos de IBS e CBS para outras empresas.
Recolher IBS e CBS pelo regime normal, fora do Simples, permitindo a apropriação e transferência integral de créditos tributários.
2.1.1. Apropriação de Créditos com a Reforma
Se a empresa do Simples optar por continuar no regime unificado, não poderá se creditar dos tributos pagos nas suas aquisições de bens e serviços. Isso pode prejudicar fortemente sua competitividade, especialmente agora que o IBS e a CBS serão tributos 100% não cumulativos, ou seja, que geram créditos para as empresas fora do Simples.
No entanto, se a empresa optar pelo recolhimento separado de IBS e CBS, poderá aproveitar os créditos das suas compras, como fazem as empresas no regime de Lucro Real ou Presumido, o que pode gerar economia e aumentar sua competitividade. Essa segunda opção é ainda mais vantajosa para empresas que atuam no meio da cadeia produtiva, pois permite a transferência de créditos tributários para seus clientes.
2.1.2. Transferência de Créditos para Clientes com a Reforma
Antes da reforma, empresas do Lucro real podiam se creditar de PIS e Cofins com base nas suas próprias alíquotas, independentemente do valor pago pela empresa do Simples. Após a reforma, o crédito de IBS e CBS ficará limitado ao valor efetivamente pago pela empresa do Simples, o que pode reduzir os benefícios para os compradores.
Se comparado ao ICMS que irá desaparecer após reforma, a nova sistemática de créditos continua a ter o mesmo impacto: as empresas fora do Simples poderão se creditar pelo IBS e CBS, mas apenas do valor efetivamente recolhido pela empresa do Simples.
Se comparado ao IPI de antes da reforma, a reforma será uma vantagem, já que antes, o IPI não poderia ser creditado. Mas com a reforma, será possível se creditar do IBS e CBS do valor que foi realmente pago no Simples.
3. Análise Estratégica: Vale a Pena Permanecer no Simples?
Dado que o IBS e CBS serão não cumulativos, as empresas do Simples Nacional que escolherem o regime unificado irão provavelmente perder em competitividade, pois não poderão transferir créditos para seus clientes, o que pode tornar seus produtos mais caros.
Por outro lado, optar pelo recolhimento separado de IBS e CBS permite às empresas do Simples a apropriação de créditos, o que pode compensar o custo adicional de cumprir novas obrigações fiscais e melhorar a competitividade no mercado.
Cada setor será impactado de forma distinta pela reforma, por exemplo no caso do Setor de Serviços. Historicamente, esse setor tem sido o mais onerado pela tributação sobre consumo. Com a reforma, a situação pode se agravar, já que o IBS e a CBS terão alíquotas maiores para serviços. Por isso, é fundamental que as empresas do setor de serviços analisem a possibilidade de aproveitar créditos ao optar pelo regime normal de apuração.
Oportunidades Geradas pela Reforma
Apesar dos desafios, a reforma também traz oportunidades para as empresas do Simples Nacional:
Aproveitamento de Créditos Tributários: As empresas que optarem pelo regime normal de apuração de IBS e CBS poderão compensar os tributos pagos nas suas aquisições de bens e serviços, o que pode gerar uma redução significativa nos custos.
Aumento da Competitividade: Com a possibilidade de transferir créditos para seus clientes, as empresas do Simples Nacional poderão se tornar mais competitivas no mercado, especialmente no setor de comércio e indústria.
Conclusão: Como as Empresas do Simples Nacional Devem se Preparar?
A Reforma Tributária de 2024 traz desafios, mas também grandes oportunidades para as empresas do Simples Nacional. Para garantir que sua empresa aproveite ao máximo as mudanças, é fundamental considerar os seguintes pontos:
Analisar a posição da empresa na cadeia produtiva: Empresas que estão no meio da cadeia podem se beneficiar ao optar pelo recolhimento separado de IBS e CBS.
Planejamento tributário: Avaliar as vantagens e desvantagens de permanecer no regime simplificado ou migrar para o recolhimento separado de impostos, ou ainda, sair do Simples Nacional.
Revisão de Contratos: As empresas devem revisar seus contratos comerciais e ajustar suas práticas contábeis para garantir que os créditos tributários sejam devidamente apurados e compensados, caso optem pelo regime de apuração normal do IBS e CBS. Isso exigirá uma adaptação dos sistemas de contabilidade e o treinamento de pessoal de sua empresa de modo especializado.
Ajuste nos sistemas de contabilidade e treinar sua equipe: Adaptar os sistemas para calcular corretamente despesas, custos, estoques, os créditos tributários e garantir conformidade com as novas regras. Muitas vezes, passam despercebidas operações que não necessitariam ser tributadas, como receitas provenientes da comercialização de produtos sujeitos aos regimes monofásicos, PIS COFINS, substituição tributária do ICMS, para que não haja novo ou pagamento indevido.
E se quiser entender de um modo geral como funciona a reforma tributária, segue link de nosso artigo:
E para ter mais elementos para entender as vantagens e desvantagens em aderir ao Simples Nacional, acesse nosso artigo:
https://www.pontesvieiraadvogados.com.br/post/vantagens-e-desvantagens-de-aderir-ao-simples-nacional
Por fim, para mais informações, não hesite em nos contatar.
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